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Andor: Quem é você?

Um especial do Clube de Cultura do Boa Noite Internet em uma galáxia muito, muito distante

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crisdias
jul 11, 2025
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Fui um bom subinspetor! Fui muito bom. Resolvi um duplo homicídio e encontrei o assassino em dois dias. Fui excessivamente ambicioso, sim, mas o tempo estava escapando e a oportunidade era real. Serviço ao Império — você acabou de dizer isso. É possível ser agressivo demais ao preservar a ordem? Eu não merecia o que aconteceu.
— Syril Karn (em roteiro de Beau Willimon)

Esta é mais uma edição do Clube de Cultura do Boa Noite Internet, onde juntos passeamos e conversamos sobre um livro, série, filme, jogo ou qualquer “peça de cultura”. Já tivemos livros como Resista: não faça nada, de Jenny Odell e A crise da narração, de Byung-Chul Han. Semana passada, terminamos Amusing ourselves to death, de Neil Postman, escrito em 1985, que nos ajuda a entender o cenário de mídia atual. Semana que vem teremos um novo livro, mas neste ritmo de julho resolvi falar de uma das melhores séries da TV, Andor. Na verdade, de um episódio específico.

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No começo do filme Argentina 1985, há uma cena onde a família do promotor federal Julio César Strassera (ninguém menos que Ricardo Darín) assiste na TV o pronunciamento do Ministro do Interior da Argentina, Antonio Tróccoli, defendendo que, em vez dos militares da ditadura recém terminada, quem deveria ser julgado eram os “terroristas de esquerda” que ameaçaram o país.

Strassera-Darín fica pistola com a audácia, vai para a janela fumar um cigarrinho e se dá conta de que o bairro inteiro está vendo Tróccoli na TV, mostrando que “o país estava dividido” sobre o julgamento dos militares
— ou, no mínimo, com medo depois de tanto tempo sob um regime brutal. E eu só conseguia pensar: Nossa, como eles produziram essa cena? Alugaram o prédio inteiro? Efeitos especiais? Painéis de LED em cada apartamento?

Normalmente, não é assim que vejo filmes. Eu só aproveito o passeio e não fico analisando cada roteiro, fala, plot twist. Tampouco fico tentando “adivinhar” quem é o assassino, qual o mistério, nem nada assim, o que acaba sendo ótimo, já que consigo me surpreender muitas vezes — fora as coisas altamente telegrafadas, ou estragadas por trailers que mostram muito mais do que deveriam.

Só que nos dias seguintes começo a pensar. Lembro de uma cena, vejo um clipe nas xoxal redes, converso com alguém… E começo a ver as partes ruins da coisa. Foi o que aconteceu no final de Lost, uma série com a qual eu tinha uma ligação emocional forte por coincidir com uma parte legal da vida. Assim que Jack fecha os olhos e a série termina, senti um sentimento de encerramento. Puxa, é isso, acabou a jornada, adeus personagens queridos, foi bom.

Dali em diante foi ladeira abaixo. Quanto mais eu pensava que os criadores da série passaram anos prometendo que a “explicação” da série não tinha nada de sobrenatural e que eles não estavam mortos o tempo todo… Deu no que deu. Eu me senti traído.

O mesmo aconteceu com A Ascenção Skywalker. Lá no cinema, com meus amigos, eu aproveitei o passeio. Ri daquela cena do beijo, odiei a demolição de tudo que foi construído em Os Últimos Jedi — principalmente a parte de que a Rey era uma ninguém — mas usei a expressão criada no Braincast pela Jazz Rider:1 era o melhor Star Wars do ano. Eu estava de volta ao meu universo ficcional favorito.

Tem também o inverso. Eu achar “só OK” alguma coisa que todo mundo está surtado para, um tempo depois, “bater”. Refletir sobre escolhas e construções narrativas e ligar isso com a vida aqui fora das telas.

Foi o que aconteceu com a segunda temporada de Andor, que foi ganhando espaço no meu coração com a passagem dos dias — não ajuda muito essa coisa de ver mais de um episódio por dia, prefiro uma digestão lenta da história. O ápice dessa ficha narrativa caindo foi a cena que dá título ao episódio 8: Who are you?. Demorei pra entender isso, mas já chegamos lá.

Super spoilers de Andor a seguir. Não vou detalhar cada coisa que acontece em cada episódio porque, se você ainda não viu Andor precisa dar esse play agora.

Spoiler zone

Na primeira temporada, conhecemos o funcionário imperial Syril Karn (Kyle Soller).

Ele não tem pai. Foi criado pela mãe, que é praticamente uma daquelas mães obcecadas por fama — da pior espécie. Ele tem uma necessidade extrema de impressionar, de preencher um vazio dentro de si. E isso se traduz numa busca incansável por chegar ao topo, seja qual for o campo em que ele esteja. O campo que ele escolheu é marcado pela rigidez, pelo controle absoluto e pela dominação. Acho que conseguimos costurar bem isso nas cenas do Syril com a mãe dele.
— Kyle Soller para a Total Film em 2022 (o grifo é meu)

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