Quando gráficos não dizem nada — mas geram medo

O truque é fazer você sentir medo, raiva, nojo ou tristeza. (fiz uma referência a Divertidamente sim)

Hoje em dia inventam estatísticas para provar qualquer coisa. 40% das pessoas sabem disso.
— Homer Simpson

Algumas edições atrás falei da necessidade de olharmos com critério os feedbacks da vida. Indicadores não faltam no mundo e a armadilha é pegarmos os fáceis, que normalmente são aqueles que confirmam alguma coisa que já "sentíamos" (ou desejávamos).

É difícil focar nos feedbacks certos

Pois eis que semana passada pipocou nas minhas xoxal redes o gráfico abaixo. Do Linkedisney ao grupo de Zap, o clima era de "estamos perdidos". O céu está caindo. As pessoas não só são burras, as do Brasil são mais burras ainda! Çocorro!

O gráfico foi feito com dados da pesquisa Truth Quest, conduzida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, desenvolvida para medir a capacidade das pessoas de identificar conteúdo falso e enganoso online. Realizada em 21 países, a pesquisa foi feita com aproximadamente 2.000 participantes por país, selecionados de forma a representar demograficamente cada população. Utilizando uma abordagem gamificada, os participantes interagiram com conteúdos verdadeiros e falsos em uma interface que simula uma rede social, incentivando o engajamento por avatares e pontuações. O principal objetivo era avaliar a habilidade dos indivíduos em diferenciar entre informações verdadeiras e enganosas, abrangendo temas como meio ambiente, saúde e assuntos internacionais. Uma pesquisa bem necessária neste quarto-de-século 21.

O Brasil, como podemos ver, ficou em último lugar. Lá atrás. Péssimo. Cadê meu passaporte europeu?!? Desespero e crise das redes.

Mas como eu sou eu, a alegria das festas (só que ao contrário), logo de cara olhei as escalas dos gráficos e vi que elas tratavam não de uma pontuação, mas de um "desvio da média". Na capacidade das pessoas em todo o planeta de identificar notícias falsas, os finlandeses foram 6% melhor do que a média global, o Brasil 4% pior.

Não é isso que o gráfico mostra. A imagem — criada por um perfil de Instagram especializado em infográficos — escolheu uma escala gráfica para acentuar esse abismo. Provavelmente porque fica mais harmonioso na tela, vamos aqui dar o benefício da dúvida. Mas que também dispara todos os nossos gatilhos "só no Brasil mesmo", os vira-latas latindo.

Eu ia dizer que o gráfico não contava a história toda, mas a verdade é que ele não conta nada. 10 pontos percentuais separam os dois países. Não sabemos nem onde é o centro. Não sabemos o critério e nem mesmo a margem de erro.