Nem a Microsoft aguenta mais o Teams: o que isso diz sobre o trabalho remoto?
Faça o que eu digo, compre meus produtos, mas não faça o que eu faço.
Falar mal do Microsoft Teams é covardia. Mas agora temos um novo integrante no nosso grupo de haters: a Microsoft!
A empresa anunciou que vai passar a exigir que funcionários trabalhem presencialmente pelo menos três dias por semana até fevereiro de 2026. A justificativa, segundo Kathleen Hogan, Chief People Officer da empresa, é de que “quando as pessoas trabalham juntas presencialmente com mais frequência, elas prosperam — ficam mais energizadas, empoderadas e entregam resultados mais fortes”. Ata.
Mas… e o Teams, querida Máicro? Essa ferramenta maravilhosa? Bom, pelo menos não instalaram rastreador de cliques que nem certos bancos por aí… (ou será que instalaram?)
A Microsoft se tornou uma empresa de 4 trilhões de dólares em 2025, com Satya Nadella recebendo 79,1 milhões de dólares anuais entre salário e bônus. Ao mesmo tempo, demitiu 15 mil funcionários em 2023 — de um total de mais de 200 mil — para liberar fundos e investir 80 bilhões em infraestrutura de IA. Agora, diz que precisa de “energia e momentum” presencial para construir os produtos de IA que definirão esta era.
Isso quer dizer que acabou para o trabalho remoto — está aí a corporação trilionária que cria produtos para facilitar a colaboração digital provando?
Essa é a pergunta errada.
Eu mesmo fiz 3 reuniões presenciais só hoje, foi muito melhor do que videoconferência. A diferença é só uma questão de abordagem e controle. As empresas parecem usar a digitalização do trabalho de um jeito errado: querendo reproduzir digitalmente o ambiente físico.
Lugares como Basecamp, Automattic e GitLab continuam operando remotamente com sucesso — desde antes da pandemia. A diferença fundamental é que elas entenderam que trabalho remoto não significa fazer videochamadas o dia inteiro tentando simular um escritório. Não é “trabalhar como no escritório, só que em casa”. É repensar o trabalho.
O GitLab opera com mais de 2 mil funcionários distribuídos pelo mundo e publica seu manual de trabalho remoto para qualquer um que queira ler. A Basecamp eliminou reuniões desnecessárias e criou um sistema de comunicação escrita estruturada chamado “Heartbeats” — seus fundadores lançaram livros sobre o assunto, já li, são ótimos.
O segredo está na comunicação assíncrona. Em vez de forçar todo mundo a estar online ao mesmo tempo, essas empresas priorizam documentação clara e processos que respeitam fusos horários e ritmos individuais de trabalho. Cada tarefa tem responsável e prazo claros. Cada decisão fica registrada por escrito. Ninguém precisa ficar assistindo colega trabalhar pela webcam.
A Automattic — empresa por trás do WordPress e do meu tocador de podcasts favorito, o Pocket Casts — nem tem escritório físico. Funciona 100% remota desde sua fundação usando ferramentas próprias que centralizam comunicação, gerenciamento de projetos e relatórios de progresso. Resultado? Menos reuniões, mais produção.
É um sistema focado no foco. Um ambiente de trabalho sem “posso te interromper um instantinho?” (agora já interrompeu…) Porque o melhor ambiente de trabalho é aquele onde você pode, de fato, trabalhar.
Essas empresas investiram pesado em treinar funcionários e gestores para colaboração remota efetiva. Não apenas jogaram todo mundo em casa com um laptop e disseram “se vira”. Criaram programas estruturados de integração, eventos virtuais regulares para manter a coesão da equipe, redes de apoio para combater isolamento.
Mais importante ainda: abandonaram a tentativa de controlar horários e monitorar atividades — um “relógio de ponto virtual”. Focaram em resultados mensuráveis e metas transparentes. Se o trabalho está sendo entregue com qualidade e no prazo, não importa se foi feito às 3 da manhã ou 3 da tarde.
Confiar no resultado em vez de vigiar o processo — radical demais para o século 21?
Olhando de longe, a impressão que fica é que a Microsoft, como tantas outras grandes corporações, nunca realmente abraçou essa filosofia. Só tolerou o remoto como necessidade pandêmica, mas sempre com um pé atrás. Agora volta correndo para o modelo que conhece, mesmo contradizendo o que vende.
No fim, é só uma questão de controle sobre a produtividade do funcionário, já falei disso aqui.
O problema nunca foi trabalho remoto ou presencial, mas sim tentar encaixar modelos novos em estruturas antigas. Se sua organização ainda insiste em reuniões intermináveis no Zoom tentando simular o escritório, o problema não é a tecnologia. É a mentalidade.
Sua empresa está voltando ao presencial porque funciona melhor ou porque ninguém teve coragem de repensar como o trabalho deveria acontecer? A resposta define se você está construindo o futuro ou apenas tentando preservar o passado.
Fontes:
Microsoft mandates return to office, claims Teams and all remote work solutions are inferior — Windows Central
Key lessons to learn from successful remote companies — Turing
5 big companies thriving in the era of remote work — Right Recruit Agency
Basecamp's effectiveness in remote work environments — MyBites
How we work — Basecamp Handbook
5 companies that switched to remote work — Remote.co